segunda-feira, 4 de abril de 2011

CABANAS (AFIFE)

ROMANCE NA PONTE DE  SÃO JOÃO - Seria o meu título

Desta tarde de Setembro
Fecho meus olhos e lembro
a casa agora vazia
Murmúrios de rio que corre
E aquela voz que não morre
pois não morre a poesia.
Poço Azul, Mata de Cima
Azenha d'além da Ponte
Ai cruzeiro de lembranças
e o riso das crianças
já não ecoam no monte
A Sónia, o Augusto, a Dinorah
quem me dera ouvir agora
- Onde vais Maria Lua?
O sino da torre calou-se
a janela aberta, fechou-se
e a capela ficou nua
Minhas flores brancas de noiva
murcharam de tanta dor
Ai Senhora do Pilar
ninguém reza nesse altar
não há santo protector.
Que é da cerejeira do tanque
e dos cantares ao luar?
Ranchos vindos do monte
secaram a vossa fonte
já não oiço o seu cantar.
Onde estás Nelson de Covas
que é da tua concertina?
sorriso o teu de criança
em Cabanas não há dança
chora-se a tua sina
Rio correndo prá foz
murmúrios daquela voz
que nunca se há-de calar
Campos da cor da esperança
como os olhos da criança
cujo crime era sonhar
Velhinha a casa sorrindo
viu Mariana crescer
deixou-se dormir sonhando
quem sabe, talvez rezando
pra poder voltar a ver
Povo Nobre Raça Antiga
Afife do monte e do mar
Se passares neste caminho
peço-te, vai devagarinho
não vá a casa acordar
e as zíneas, senhor as zíneas?
Hidrângeas da cor do Mar
Terreiro, terreiro novo
foste de Reis e do Povo
onde ninguém vai bailar
Carvalhos da beira-rio
que esperais pra morrer?
De pé sem raiva nem medos
levai convosco os segredos
do olhar que os viu nascer
do caminho ergo o olhar
a árvore parece lembrar
alguém que já conheceu
agitam-se aqueles braços
que fortes são estes laços
entre Cabanas e eu
E o meu olhar cansado
afasta-se deste passado
da casa agora vazia
murmúrios de rio chorando
como alguém implorando
que não acabe este dia.

Setembro de 1987
Quem isto escreveu foi Helena Tarouca, casada em Cabanas com Salvador Homem de Mello.
A voz que se tinha calado era a de Pedro Homem de Mello.
O sítio é em Afife, as gentes também.
Só o  Nelson é de Covas. É o Vilarinho o tal da madeixa já branca de Maria Manuela Couto Viana.

Tenho a felicidade de morar a cem metros deste destroço. Por isso entendo o esfrangalhar das lembranças.
Destas a Helena Tarouca me ofereceu o original manuscrito que guardo como quem guarda a custódia.

A memória, mesmo a factual, até essa o tempo matará. O Povo, o tal Povo morrerá com ela.
Mas como dizia o Poeta não deixará a sua vivência para algum herdeiro. Está tudo explicado no POVO QUE LAVAS NO RIO.

O TIO BENIGNO DE GONDARÉM foi menos profundo

"A MINHA ARTE TREMINOU
MAS NÃO SE BENDE."

Levou-a com ele para a cova!

Lopesdareosa

Melhor ilustração para este texto não haverá senão esta imagem da autoria de Mariana Homem de Mello, filha de Helena Tarouca.



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